Fontes: CONTEE e Agência Senado
Especialistas defenderam nesta quarta-feira (28) a constante avaliação do Novo Ensino Médio, com a atenção concentrada na realidade de cada município e de cada estudante e com investimento na formação e valorização de professores, na infraestrutura das escolas, na redução da desigualdade entre as redes públicas e privadas e na flexibilidade da questão curricular.
A análise foi feita durante a quinta audiência pública interativa promovida pela subcomissão temporária que avalia os desafios no processo de implementação do Novo Ensino Médio no Brasil, iniciado em 2022. Ao final dos trabalhos, a subcomissão apresentará um relatório sobre as discussões.
A chamada reforma do ensino médio teve seu marco normativo confirmado na Lei 13.415, de 2017, decorrente de medida provisória (MP) apresentada em setembro de 2016. Até o momento, os entes federativos têm encontrado inúmeras dificuldades e barreiras em sua implementação, por razões diversas e variadas motivações, destacou a senadora Teresa Leitão (PT-PE), no requerimento de realização do debate (REQ 5/2023).
— Temos convergência de opinião na subcomissão, mas outros olhares só fazem enriquecer a responsabilidade de alterar a rota com compromisso e reafirmar os direitos dos estudantes e dos profissionais — afirmou a senadora.
Direito à educação
Pró-reitor de ensino do Instituto Federal Fluminense (IFF) e representante do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif), Carlos Artur Arêas disse que uma reforma curricular não basta para discutir a qualidade do ensino médio, que está no “coração” do direito à educação. Em sua avaliação, é preciso discutir questões estruturais, questões de salário, a valorização de profissionais e a infraestrutura das escolas, entre outros temas.
Ele também cobrou a implantação de uma “educação integrada e integral, que é a educação que trata o ser humano na sua forma completa, para a vida e a cidadania científica, artística e intelectual”.
— Cada vez que apontamos para obrigatoriedade apenas, por exemplo, para matemática ou português no ensino médio, estamos apontando no sentido contrário, de que basta um conhecimento instrumental ou competências específicas para que um trabalhador exerça as suas funções. Existem modelos que caminham para uma profissionalização, mas abrem mão de discussão mais ampla da cidadania — afirmou.
Arêas defendeu ainda a construção de uma nova base comum curricular, que precisaria ser refeita na forma, conteúdo e duração, além da possibilidade de ampliação da educação profissional, que hoje só atinge 10% dos alunos do ensino médio — bem inferior aos 40% verificados nos 38 países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Em resposta a perguntas enviadas por internautas, Arêas ressaltou que a educação é multidimensional, e que não dá para dissociá-la da formação de professores, elaboração de cargas horárias, flexibilidade da questão curricular e diferenças entre a rede pública e a escola privada.
— Mais da metade dos jovens brasileiros com 24 anos ou mais não concluíram educação básica. Como fica o direito desses jovens à educação? — questionou.
Escolas estaduais
Reitor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e vice-presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino (Andifes), Alfredo Macedo Gomes salientou que o ensino médio no Brasil, de maneira geral, ocorre especialmente nas escolas estaduais, que concentram a grande maioria das matrículas.
— Não queremos um ensino médio que leve apenas à educação superior, mas é necessário discutir o caráter formativo e o que ele pode entregar à etapa conclusiva do ensino básico brasileiro. Em geral, o ensino médio tem sido olhado de maneira terminativa de um processo formativo, mas nós entendemos como uma dimensão da educação básica. É necessário considerar o fortalecimento da forma integral e integrada para todos os alunos do ensino médio, caminhar no sentido de formação integrada, constituindo a possibilidade muito concreta do direito de formação qualificada aos estudantes, o fortalecimento de uma rede nacional que possa dialogar a partir de um regime de colaboração que converse mais amplamente com os sistemas estaduais — afirmou.
Gomes disse ainda que é preciso garantir a formação do aluno em todas as áreas de conhecimento, e não apenas de forma restritiva ao português e matemática, avançando na direção de uma educação que leve à formação crítica, reflexiva, comprometida com o entendimento dos problemas presentes nas diferentes áreas de conhecimento, o que irá possibilitar a formação de pessoas capacitadas ao ingresso no ensino superior.
Em resposta aos internautas, Gomes afirmou que é preciso colocar a educação como vetor de desenvolvimento nacional e olhar para o setor de forma mais estratégica para que as mudanças no ensino médio reflitam a realidade nacional, além de fortalecer a linha de organização das escolas na sua individualidade e peculiaridade, estimulando a presença da juventude na educação.
Renovação com responsabilidade
Ao endossar as posições dos dois debatedores que o antecederam, o presidente da Associação Brasileira dos Reitores das Universidades Estaduais e Municipais (Abruem), Francisco do Ó de Lima Júnior, defendeu a renovação do ensino com responsabilidade e a adoção de uma nova base nacional curricular, além de um esforço para a formação de professores e o fortalecimento de programas de residência pedagógica.
— É preciso pensar na continuidade de programas que atendam níveis mais avançados da educação, não só o ensino primário. Pensar na valorização da educação numa perspectiva reforçando a Constituição e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, que é a ideia de colaboração e cooperação em níveis diferenciados, o envolvimento constante com entidades que representam a comunidade escolar de base, além dos profissionais de educação – afirmou.
Lima apontou a necessidade de revisão do ensino médio não só na concepção, mas, principalmente, em relação aos diferentes vetores e métodos, na perspectiva que inclua ainda questões relacionadas à formação do professor, reforço nos investimentos, valorização da carreira docente e um currículo que “não seja engessado”.
“Escola melhor”
Presidente da Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep) e representante da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes), Bruno Eizerik disse ser “totalmente favorável” à implementação do Novo Ensino Médio, que trará um modelo de escola melhor para os jovens brasileiros.
— Mesmo que a lei seja de 2017, esse modelo já começou a ser discutido na década de 1950. Nós não estamos inventando a roda. O Brasil é o único país que tinha escola única para todos os alunos, e nós sabemos o resultado que essa escola única oferece para nossa sociedade. 95% dos jovens que terminam o ensino médio não têm conhecimento esperado em matemática, 69% não têm em português. Precisamos modificar nosso ensino médio com uma escola plural com protagonismo do aluno, esse é o cerne do ensino médio que tem que ser mantido. Dois terços das escolas vão aumentar a carga horária, temos 49% das instituições que vão aumentar o número de professores — afirmou.
Se o Brasil enfrenta dificuldades na implementação do novo ensino médio na rede pública, disse Bruno Eizerik, esta se deve “ao trabalho não realizado pelo Ministério da Educação no último governo, que acabou deixando a implementação do novo ensino médio a cargo dos estados, e aí tivemos muita coisa acontecendo sem centralidade e sem coordenação federativa”.
— Temos que pensar sempre nos alunos e o que é importante para os alunos, e não para os professores donos de seus conteúdos. Quem trabalha com educação sabe que nunca estamos prontos e que sempre há para construir. Pode haver ajustes, mas não podemos calar frente ao discurso de falta de estrutura das escolas públicas. Essa é uma questão estrutural, mas não pode barrar a implementação de um novo ensino médio que coloca o Brasil na linha dos demais países. Precisamos de uma reforma tributária, administrativa, mas ainda mais que a educação seja prioridade no país e, para isso, precisamos do Congresso Nacional, precisamos de uma política de Estado de longo prazo para a educação. Temos que implantar e analisar os resultados, mas não deixar de implementar — afirmou.
Em resposta a perguntas enviadas por internautas, Bruno Eizerik afirmou que o Novo Ensino Médio criou na escola um espaço há muito tempo esperado, de autoconhecimento e escolhas.
— Nós, da escola privada, não estamos satisfeitos com o abismo entre a escola privada e a escola pública. Queremos que a escola pública seja melhor, precisamos da escola pública forte, que ofereça serviço para os cidadãos. A rede privada conseguiu fazer a implementação e, muitas vezes, com professores da rede pública que atuam na rede privada. É preciso gestão e vontade política para fazer acontecer o Novo Ensino Médio — concluiu.